A associação de dois tipos de plantas, como gramíneas e árvores, já pode ser considerada um sistema agroflorestal, embora se possa atingir complexidades muito maiores, com uma dúzia ou mesmo 30 espécies diferentes em uma única agrofloresta, apontam especialistas.
As mudanças climáticas pelas quais passa o planeta vêm impondo consequências severas à agricultura, provocadas por fenômenos extremos como tempestades, secas e inundações, por exemplo. Culturas uma vez consideradas absolutas, como café e vinho, hoje se reinventam em diferentes pontos do globo, buscando novas técnicas de plantio, manejo e comercialização de forma sustentável. Outro exemplo são as plantações de cacau.
Ao adotar um sistema agroflorestal, o produtor vai aliar árvores (que podem ser frutíferas e também de boa qualidade de madeira, por exemplo) a plantas de menor porte, como legumes, hortaliças, cereais e leguminosas. Como aponta o instituto WRI Brasil, as diferentes culturas enriquecem o solo e melhoram a qualidade dos alimentos e da água, trazendo benefícios também no viés econômico.
“Hoje, áreas extensas de monocultivo têm risco de se tornar improdutivas. Plantios como o de algodão, que demanda muita água, vão aos poucos se tornado inviáveis [como monocultura]. Então, produtores de grande escala também estão apostando em aumentar a sua biodiversidade”, afirma Márcio Armando, analista da Embrapa em Brasília com 30 anos de experiência em SAFs.
Apesar de a monocultura ter potencial produtivo inegável, a exaustão do solo e o uso insustentável de recursos naturais, principalmente a água, além da pressão do desmatamento, são alguns dos fatores apontados como características que fazem com que esta forma de produção esteja com os dias contados, afirmam especialistas.
Dentro do escopo da agricultura regenerativa, que busca preservar a saúde do solo e sua riqueza mineral, grandes marcas mundiais sinalizam investimentos de grande porte para gradualmente mudar seus métodos de produção com foco na sustentabilidade e adaptação climática.
O Brasil ocupa uma posição de protagonista neste movimento, com grande corpo de pesquisa no assunto e vasta área de cultivo. Contudo, grandes mercados como Estados Unidos e União Europeia já têm no radar as agroflorestas dentro de um repertório de soluções para a produção de alimentos e matéria-prima.
O desafio da produtividade
Talvez o maior desafio para os SAFs seja garantir a produtividade na comparação com as monoculturas. A vantagem econômica das agroflorestas está em sua diversidade, apontam especialistas. Ao planejar o plantio de espécies adequadas à região escolhida, é possível ter colheitas variadas, além da opção da madeira de qualidade fornecida pelas árvores cultivadas.
“Os sistemas agroflorestais são uma sofisticação do manejo. Você pode ter 30 espécies, com quatro potencialmente comerciais e outras fazendo a sua função no ecossistema”, observa Armando.
A Courageous Land, empresa com projetos de agricultura florestal em Roraima, Bahia e São Paulo, é especializada em levar a modalidade para a larga escala usando tecnologia para monitorar produtividade e lucratividade de forma sustentável. O CEO do escritório destaca que, além de produzir frutos, hortaliças e madeira de impacto positivo, uma propriedade com sistemas agroflorestais ainda tem potencial para lucrar no mercado de créditos de carbono.
“Uma novidade no mercado é consorciar a produção da agrofloresta com financiamento atrelado aos créditos de carbono. Este mercado surgiu para estimular projetos que sequestram carbono e não sairiam do papel sem esse incentivo. As agroflorestas dividem sua biodiversidade com a atratividade financeira do crédito de carbono”, avalia Philip Kauders, CEO e cofundador da Courageous Land.
Transformar a monocultura em uma produção sombreada, por exemplo, com pasto e eucalipto, pode ser considerado agrofloresta. Porém, mais atraente pode ser cultivar na propriedade árvores que produzam castanhas, frutas, além da madeira e da absorção de carbono. Comparado à monocultura, é possível que haja queda de produtividade, mas a sua resiliência econômica aumenta com variedade de produção, afirma Kauders.
Outro ponto observado pelo executivo é de que não é preciso radicalizar, ou ter uma “selva” para iniciar um sistema agroflorestal. Em uma plantação de soja em larga escala, por exemplo, pode-se colocar a cada 400 metros uma fileira de árvores, que já terão poder de impactar a biodiversidade de fauna e flora no local, entre outros benefícios.
Sobre o caráter socioeconômico dos SAFs, um destaque é o estímulo à geração de postos de trabalho no campo no Brasil, dada à escassez de mão de obra vivida pelo setor.
No país, a maior parte das agroflorestas hoje está em pequenas propriedades rurais. Porém, o desenvolvimento deste modelo como forma de descarbonização de grandes empresas, e da própria economia brasileira, faz com que os SAFs sejam um candidato ao título de “agricultura do futuro”.
Fonte: Portal Um só Planeta